UMA MULHER QUE SE LIBERTA
- Hnasmdro
- abril 4, 2023
- Experiências MDR
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Esta tarde chega Faustina, com muito entusiasmo a nossa casa porque inicia um curso na linha da Teologia Feminista. Apesar do interesse pelo tema, vem com muitas dúvidas e sobretudo com uma preocupação: Como será um curso deste tipo? Hoje ao vê-la com este interesse, confiança em si mesma e abertura, os meus pensamentos trasladam-me para uns anos atrás: Faustina, é uma mulher viúva com um filho, com uma timidez enorme que falava balbuciando, silenciosa, olhar agachado quando se lhe perguntava algo e ganhava a vida como modista, porque era pobre e não recebia apoio de nenhum familiar. Sempre a via sentadita e caladita, mas com um sorriso.
Hoje, Faustina é uma servidora ativa dentro da Paróquia, é uma “Celebradora da Palavra”, representa a Área das Mulheres a nível da Diocese, e durante vários anos, foi a autoridade principal do seu povo. O que fez com que Faustina mudasse desta maneira?
O pertencer à Coordenação Diocesana de Mulheres (CODIMUJ), uma das estruturas pastorais da Diocese de São Cristóvão de Las Casas, Chiapas, deu-lhe a oportunidade de reconhecer o seu valor e dignidade como filha de Deus, de empoderar-se como mulher com direitos e deveres. A CODIMUJ tem como objetivo o acompanhamento entre mulheres no caminho por uma libertação integral, num mundo de iguais.

Ao início, esta área não foi tão facilmente aceite na Diocese porque partiu do “ver” a situação de clamor, opressão e submissão das mulheres. A Irmã Maria del Cármen Martínez (MDR) junto com outras agentes de pastoral queriam responder à situação de exclusão das mulheres, com a convicção de que as mulheres “podemos”, não que sejamos “mais” nem melhores que os homens, senão iguais no caminhar juntos/as, “com os dois pés”, como se prega entre os tzeltales (grupo originário da Diocese). Em que temos direito e dignidade como o diz a Palavra de Deus, liberdade de “sair” e o fazemos com responsabilidade. Comenta Maria del Cármen: “Me senti chamada e impulsada a convocar e a nos acompanharmos como mulheres que buscam libertação, viver em dignidade e igualdade e participar construindo uma nova humanidade”.
Não consta uma data fixa do início desse acompanhamento entre mulheres, mas sim o reconhecimento como Área de parte da estrutura diocesana, em 1992. A coesão das mulheres na Área é a Palavra de Deus lida a partir de “nós”, com sabor a mulher – como a tortilha sabe a mão de mulher ao ser feita por ela com o milho trazido e carregado pelo homem, enfoque tzeltal. Inclusive, o lema da área é “Ler a Palavra de Deus com olhos, mente e coração de mulher”. Desde o princípio um critério claro foi: “somos mulheres crentes no Deus da Vida e em Jesús de Nazaré e a nossa contribuição era a partir da Palavra com formação crítica e integral”.
As mulheres foram descobrindo o grande amor de Deus para com as suas criaturas, a liberdade a que convida o Evangelho. O “sair de casa” abriu-lhes os olhos e permitiu-lhe verem-se a si mesmas, os seus passados e presentes para ir superando esse grande pecado histórico de excluir as mulheres. O juntar-se e chegar a ser muitas dá-lhes valor e audácia. Sentem-se herdeiras, memória, multiplicadoras e com uma resistência criativa.

Na atualidade, há um grande número de grupos de mulheres que foi crescendo e estendendo-se pelas comunidades, paróquias, zonas e Dioceses, ainda que em algumas zonas, há sacerdotes que não apoiam esta área. Estas mulheres foram-se comunicando, articulando, identificando-se como mulheres crentes, comprometidas a participar em tudo, gerindo mudanças na família, na Igreja e na sociedade, participando em marchas, em organizações e na sociedade civil. E é assim, que mulheres como Faustina, hoje podem dar uma palavra em diversos espaços – social, religioso, cultural e político – e são um testemunho de que quando se caminha em sinodalidade e especialmente entre mulheres, há uma mudança integral.
Eneida Chavarría,
Comunidade de São Cristóvão de Las Casas,
México.